Diário do Nordeste
29/03/2017
Para os pesquisadores que acompanharam a pesquisa, as crianças que dizem se sentir seguras vivem em cenários de violência e acabam naturalizando essa situação em que estão inseridas ( Foto: Agência Di
Qual a percepção de crianças e adolescentes sobre as situações de violência que os rodeiam? Sentem-se seguros? Identificam os riscos? Foi partindo de indagações como estas que a ONG Visão Mundial, que atua no Brasil desde 1975, em 10 estados, realizou um levantamento, entre setembro de 2015 e março de 2016, sobre "o que pensa a população infanto-juvenil em relação à violência?". Em Fortaleza, 125 crianças e adolescentes foram entrevistados. Destes, 71% garantiram sentir-se seguros, embora sejam moradores de áreas periféricas historicamente permeadas pela violência.
O mapeamento realizado em 12 cidades brasileiras - Recife, Maceió, Salvador, Canapi (AL), Catolé do Rocha (PB), Dix-sept Rosado (RN), Inhapi (AL), Nova Iguaçu (RJ), Itinga (MG), Mossoró (RN) e Manacapuru (AM) - entrevistou no total 1.404 crianças e adolescentes com idade entre 8 e 17 anos.
Os resultados foram divulgados, ontem, em uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Ceará, que foi coordenada pelo deputado estadual Renato Roseno, membro da Comissão da Infância e Adolescência.
Na capital cearense, dos 125 entrevistados, 64 são do sexo masculino e 61 do feminino. Do total, 21% apontaram "uma média percepção de segurança". Fortaleza não registrou casos de alta percepção de insegurança. Apenas Salvador e Nova Iguaçu contabilizaram tal índice.
Coleta de dados
Segundo a assessora de proteção infantil da ONG Visão Mundial, Karina Lira, as crianças entrevistadas na Capital residem no Bom Jardim e São Miguel. Os dados foram coletados em escolas e associações destas áreas.
Para executar o levantamento, a ONG utilizou uma ferramenta chamada Índice de Segurança da Criança (ISC), que é um aplicativo de pesquisa desenvolvido em 2013 pelo Instituto Igarapé (instituição sem fins lucrativos, com sede no Rio de Janeiro). A ferramenta, conforme a ONG, tem um conjunto de indicadores para identificar os impactos psicológicos, emocionais e físicos da insegurança sobre as crianças. A violência nesse caso pode ser interna (intrafamiliar) ou externa e vai de aplicação de castigos físicos a assédio e violação do corpo.
Na análise, segundo a ONG Visão Mundial, crianças responderam cerca de 30 frases afirmativas e podiam concordar ou discordar em uma escala que vai de 1 a 3, gerando um resultado individual para o ISC.
Dentre as constatações divulgadas pela ONG estão: a avaliação que as crianças pesquisados "não percebem um alto nível de insegurança, apontando para uma normatização da violência vivenciada" e "a casa é o ambiente onde este público se sente mais seguro". No levantamento, cerca de 40% dos entrevistados disseram não se sentirem seguros na comunidade em que residem ou escolas onde estudam.
"Quando olhamos o cenário geral e também o de Fortaleza, temos respostas que levam a sensação de segurança. Porém, identificamos que as crianças que dizem se sentir seguras, vivem em cenários de violência e acabam naturalizando essa situação. É uma máxima de 'apesar de sofrer, estamos seguros' e não é essa a segurança que deve existir", explica Karina Lira. Para ela, um dos grandes diferenciais do trabalho é gerar dados (diante da escassez de informações) que podem ajudar na formulação de ações protetivas e de prevenção.
Ampliação
Na audiência pública, o deputado Renato Roseno sugeriu ampliação do levantamento e mencionou a possibilidade da realização de uma nova pesquisa contemplando diversos municípios do Ceará. A Comissão da Infância e Adolescência da Assembleia poderá avaliar a possível parceria com a ONG para executar esta nova ação.
A assistente social da Secretaria Municipal do Trabalho, Desenvolvimento Social e Combate à Fome (Setra), Érica Araújo, representou a Pasta no evento e garantiu que este mapeamento ajudará a "nortear" a percepção da Prefeitura de Fortaleza no enfrentamento às situações de violência que chegam diariamente aos 27 Centros de Referência de Assistência Social (Cras) e aos seis Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) da Capital.
Pesquisa
125
crianças e adolescentes foram entrevistadas. Na Capital cearense, dos 125 ouvidos na pesquisa, 64 são do sexo masculino e 61 do feminino