COLUNISTAS / AIRTON MARANHÃO (IN MEMORIAN)

A misteriosa prostituta espingarda

Airton Maranhão (in memorian)

01/09/2014

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Uma das mulheres mais bonita que já se ouviu falar e que pisou neste planeta, foi a fascinante Rousara Montalbani. Que por se destacar como uma mulher mais linda do mundo, tão bela, sublime e encantadora, causou tragédias e traição sentimental nas famílias da cidade de Florença, na Itália. Pois, quando se postava à janela, uma multidão de curiosos corria para ficar defronte a sua casa, somente para observar a sua beleza. Rousara era tão maravilhosa que nenhum comerciante aceitava pagamento pelas compras que fazia. E na missa, ninguém olhava para o altar da igreja, cavalheiros, senhoras, moças e crianças, postavam-se a fitar o rosto de Rousara. Até o padre e o sacristão ficavam estáticos diante da tão natural beleza. Que de tão dominadora e atraente, fazia os conterrâneos abandonarem os melhores prazeres da vida, só para olhar para o rosto de Rousara. E agiam como atingidos pelas flechas do seu amor. Embora com a jura de jamais olhar para aquela face de feitiço, todos os dias do rio Arno, pelo mais fatídico ato mortal, corpos de suicidas eram retirados por causa do amor à beldade. E todas as noites pelas ruas de Florença, corpos de abastados cavalheiros, bem vestidos, eram encontrados com um punhal cravado no coração, por terem sidos recusados pela divina jovem. Todos que olhavam para Rousara ficavam petrificados com a estranha beleza. Como se estimulasse desejo de sexo, de adoração e de amor eterno. E por conta dos absurdos acontecimentos com os jovens apaixonados, Rousara, por três vezes, foi conduzida ao tribunal por denúncia dos pais dos suicidas. Mas os juízes ficaram tão encantados com a beleza estonteante de Rousara, que ordenaram a sua liberdade. Mas, Rousara por ter dilapidado o dinheiro do cofre da cidade, juntamente com o tesoureiro que lhe confiara e que se suicidou, foi ordenada a comparecer novamente à Justiça. E, estranhamente, mesmo esplendorosa, bela, lascívia, com forma de ampulheta, foi condenada ao pelourinho para ser submetida à vergonha pública, com a morte por açoite. Mas, fascinados por seu talento e beleza, ninguém se atreveu a executar a sentença, e Rousara foi posta novamente em liberdade. E o duque de Florença, de tão apaixonado, por essa curiosa obsessão, com o seu material de pintura, foi para a capela e trancou-se por dentro recusando a comer e beber, só queria pintar. E como um santificado demônio, pintou uma sagrada visão, na escuridão do inferno. Seu pai foi chamado e o duque recusou abrir a porta. Mas o genitor ao abri-la à força, quase morreu de espanto. Por toda igreja, as paredes e o teto, estavam pintados de santos, anjos, madalenas, madonas e ninfetas, todos com as feições de Rousara Montalbani. E o duque sentado no templo, como pateta enlouquecido, observava os rostos de Rousara. Dessa vez Rousara foi levada à presença da Justiça, e sentenciada a reclusão solitária. Colocaram uma máscara, em forma de caveira, para ninguém mais no mundo se encantar por sua beleza. Rousara Montalbani era tão incrível que ao nasce deve ter recebido somente uma parte da vida. O resto da vida repita-se, do que restou por trás da máscara da tão bela inspiradora Montalbani, aquela metade pertencia a uma extraordinária russana, criatura estranha de imagem mais que super-realista, que com o seu fascínio primoroso de solidão, apesar de ser uma prostituta da Coaça de Russas, era excepcional. Porque vivia no mais alto grau de abominável tristeza. Embora em meio às gafieiras, orgias e bacanais afrodisíacos no cabaré da Chica do Baiano, que se suicidou virando uma tocha de fogo. A misteriosa prostituta que amargava a vida de tristeza e de quenga, era a “Espingarda”. Diferente das debochadas putas bonequeiras e das fuampas amancebadas. Espingarda, mulher extremamente esquisita, com a sua aparência hilariante, feia, magra, de braços compridos e pés miúdos, mal arrastava os dois metros de altura. Negra raríssima, boba, inocente e inofensiva, não-vista em qualquer outra parte do planeta, com a única coisa que tinha de belo, os olhos azuis. Mesmo assim, compunha o contraste da bela Rousara Montalbani. E a misteriosa prostituta russana, tinha o escalafobético apelido de “Espingarda”. Ninguém sabia o seu nome. E apelidaram-na de Espingarda, porque ela era comprida, magra e fina como uma estaca. E quando a meninada gritava: Espingarda! Ela jogava os tamancos e aos gritos, respondia: É a mãe, fio duma égua! E corria para o cabaré, com a cachorrada dos meninos correndo atrás. E não mais dormia a ouvir a zombaria dos fedelhos: - Espingarda! E no quarto, sozinha orava na procissão de sua tristeza. Embora que com toda feiúra, cobiçada pelos rabos de burros: Piru, Boêmio, Edmar Covarde, Bombom e Zé do Ouro, com pavor ao prostíbulo, a Coaça e as raparigas de pecados carnais, tentações malditas e orgias infernais, fazia de tudo para sumir da vida amargurada. Mas, sem nenhum documento de validade jurídica, para comprovar a sua existência, a idade, a nacionalidade e o nome, oculto por trás da máscara da eterna tristeza, resumido apenas na palavra, “Espingarda”. Nunca sentiu uma alegria. Ninguém nunca lhe ofertou uma flor. Nem levou para um lugar romântico, com luz de vela. Nunca lhe deram um beijo nos lábios. Nem nos olhos azuis, com todo poder de sedução. Prostituta não beija! Mas um dia, quando o famoso valentão Chagas do Couto tentou beijá-la à força, Espingarda que usava navalha e cores extravagantes do rouge e batom, irada com o ato escandaloso do famigerado valentão, jogou gasolina no corpo, riscou o fósforo e suicidou-se na Coaça de Russas. 

Airton Maranhão (in memorian)

.Originário de Russas – CE. Formado em Direito pela Universidade de Fortaleza – Unifor, advogado militante da Comarca de Fortaleza, e romancista. Livros publicados: Deusurubu, Admirável Povo de São Bernardo das Éguas Ruças. Romances: A Dança da Caipora, Os Mortos Não Querem Volta e O Hóspede das Eras. Membro da ARCA – Academia Russana de Cultura e Arte.

Airton Maranhão (in memorian)

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