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Imagino que cada ser nasce com a perfeição absoluta dos genes humano, compostos com os segredos dos próprios arquivos profissionais do que se vai ser pelo resto da vida, resguardando de raro esplendor de excepcionalidade, a aparência de suas funções. Como ao incorporado Sr. José Nunes Guedes, no apodar de Cabo Guedes, vulto ininterrupto que sempre provocava medo e correria à meninada, como se fosse uma invasão de privacidade nas peraltices, nas bagunças das crianças e traquinagens dos garotos travessos, nos gazeadores de aula, nos brigões de rua, nos “piru de sinuca”, onde, muito longe do lado sombrio da alma, tudo era a pura infância da adolescência desabrochando na fantasia e no sonho de cada um. Os meninos tinham mais medo do Cabo Guedes do que do Papafigo no Bisaco, da Mula-Sem-Cabeça e do Lobisomem. Cabo Guedes era uma espécie de Inspetor de Quarteirão, só que de uma cidade pequena, na sua época, como Russas, que para percorrê-la, bastava a sua bicicleta para fazer a ronda a qualquer hora do dia ou da noite. Aquela autoridade pontilhada por alguma ironia do dever a cumprir, não tinha a obrigatoriedade de usar farda, introspectivo, aparentava mais cacife que o próprio Chefe de Polícia, pois o Cabo, encarregado do policiamento das ruas, era obrigado a informar ao Chefe de Polícia, as desordens, agressões físicas, injúrias verbais, os problemas e as ocorrências, com poder de realizar prisões de criminosos e perturbadores da ordem. E quando um menino ou qualquer um outro infrator era pego, o mesmo era escoltado pelo cabo, a pé, onde o mesmo arrastava com uma mão a bicicleta, e com a outra mão empurrava pelo braço o menino para a casa dos pais, e o de maioridade para o quartel. E quando ocorria a prisão de algum bêbado, conduzia montado na sua bicicleta, como se diz, tangendo o infrator à sua frente, com toda autoridade que lhe era peculiar: “Respeite a polícia, vagabundo!” E aquele que não obedecesse a sua ordem de prisão, era perseguido sem trégua, por dias a fio, e quando preso, recebia carão, conselhos e às vezes maus-tratos por ter desrespeitado a imponente autoridade policial. O velho Cabo usava o seu policiamento ostensivo mais para intimidar os meninos que praticavam jogo de azar, brincavam de bola de pano, corriam com cavalo de talo, brincavam de bila, triângulo e pega-pega, corriam atrás de lorel e carro-de-boi, ficavam nas calçadas ouvindo LP na radiola, pulavam o circo, soltavam raia e pião, bancavam dado de castanha, brincavam de bola na rua, andavam com baladeira no pescoço, e aos que se reuniam nas esquinas para conversar até tarde da noite. Quando o Cabo Guedes julgava um menino que corria com atitude suspeita, principalmente “fora de hora”, perseguia com a sua velha bicicleta, como se fosse um cavalo selvagem nos calços de fugitivo perigoso: - “Tá preso, bandido!”. E assim cumpria a sua árdua tarefa de patrulhamento, tanto pedalando a sua velha bicicleta, como a tocar aquela buzina estridente a combater à criminalidade e os atentados contra a ordem social. Cabo Guedes encerrou assim a sua romanceada história de Inspetor de Quarteirão como o policial mais excêntrico de Russas.
Advogado e Escritor
Membro da Academia Russana de Cultura e Arte – ARCA
.Originário de Russas – CE. Formado em Direito pela Universidade de
Fortaleza – Unifor, advogado militante da Comarca de Fortaleza, e
romancista. Livros publicados: Deusurubu, Admirável Povo de São Bernardo
das Éguas Ruças. Romances: A Dança da Caipora, Os Mortos Não Querem
Volta e O Hóspede das Eras. Membro da ARCA – Academia Russana de Cultura
e Arte.
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